Novembro de 1939, grandes dificuldades em todo mundo, e profunda crise social económica para as gentes da Pampilhosa.
Depois dum prolongado tempo de invernia,houve melhoria nas condições atmosféricas, que permitiram inicio da colheita da azeitona, por ser abundante, iria aliviar a situação de muitos lares.
Na vila ,falava-se com preocupação do estado de saúde do notário Eduardo Carlos acometido de ataque coração que deixou as portas da morte.Dizia-se sobreviveu graças a cuidados clínicos do médico municipal Dr. Tomás Barateiro.
As obras da barragem e as da estrada possibilitavam emprego a elevado numero de jornaleiros e ajudavam a debelar a crise de trabalho.
No dia 27 de Novembro tiveram inicio os trabalhos de terraplanagem da estrada que havia de ligar a Vila a Castelo Branco.Começaram no sítio da Cabeçada, pelo lado do Vale da Grima, e director da obra era engenheiro Sousa Pinto da junta das estradas.
A expectativa quanto a utilidade da estrada , uma vez concluída ligava Coimbra a capital da Beira Baixa, gerou grande esperança na Pampilhosa .Acreditavam numa futura era de progresso e bem estar.
Ao fim e ao cabo 8 décadas passadas cada qual retire a conclusão
Vista da estrada actual desde a " cabeçada " junto ao hotel.
Tal dia como hoje, 18 Dezembro quarta- feira, vim a este mundo na fundura de um vale encravado no mar de montanhas longínquo e belo como não há outro.
Segundo apurei, naquela manhã fazia um frio de rachar, intensa nevada cobria de branco tudo quanto a vista alcançava. Meu pai, na faina da apanha azeitona, foi chamado por uma vizinha, sabendo a friagem da nossa casa de caminho passou pela loja do "manco" onde comprou um grosso cobertor de lã para me aquecer.
Sendo primeiro filho, comoveu-se quando me viu pela primeira vez, pequenito e enfezado. Passados muitos anos havia de me confidenciar, ter sentido receio que não resistisse.
Ao cair da noite desse mesmo dia, meu tio Zé Carloto, apareceu lá em casa para ver como estaria tudo, levando um cobertor igual ao que meu pai comparara, sem ter conhecimento disso, mas sabendo que precisava de me agasalhar bem, não hesitou, o meu querido e inesquecível amigo, homem de porte distinto a quem a sogra minha avó paterna, chamava com ironia "major".
Os primeiros dias de vida foram atribulados, o médico Dr. Afonso, aconselhou os meus pais a baptizarem-me depressa, para ir sem mácula para o além. E assim aconteceu, fui baptizado a 29 Dezembro, um domingo às 16 horas pelo Prior Benjamim Alves, que haveria ser mais tarde grande e sincero amigo.
Meu pai prezava muito a lei e a ordem, sabia além da Igreja para ser cidadão de facto era mister lavrar o registo civil, assim procedeu.
No final do registo o responsável pela Conservatória, Porfirio Carneiro, comunicou que os emolumentos devidos ficariam por sua conta, sendo neto do amigo correligionário Augusto Cortez, fazia empenho pagar.
Foram os meus "reis magos". Os dois protegeram-me e o terceiro honrou a condição de pertencer a estirpe de indefectível republicano.
Aqui estou hoje 7 décadas transcorridas a dissertar sobre estes factos quando tudo indicava não iria sobreviver.
Ano de 1940,época de grandes celebrações nacionais, malfadado vexatório triste para a Vila de Pampilhosa da Serra.Em texto publicado, haverá um lustro,demonstrei intenção do regime Salazarista, extinguir o concelho pampilhosense, decreto de 25 Abril daquele ano, que colocou sob tutela do estado, o Município é prova.
Confesso, não fazia ideia do desprezo e arrogância, da ditadura, e Câmara de Arganil, em cujo domínio seria integrado o nosso território, trataram a nossa terra.
Sucintamente os factos foram: Um grupo de pessoas gradas da Pampilhosa,cientes do perigo que corria a autonomia municipal, decidiram unir-se, a pretexto do 3º centenário da restauração da independência,e promoveram colocação do "cruzeiro da independência " no antigo largo da feira, convencidos dessa maneira poderiam cair nas boas graças do regime, e reverter a situação humilhante.Convidaram as mais destacadas individualidades distritais, para inauguração, realizada no 1º Dezembro, mas sucedeu algo inusitado.
O Governador Civil, Bispo da Diocese, Comandante Distrital da Legião Portuguesa , estava anunciado estariam presentes pressionados pelo Governo,faltaram
Ao acto compareceram, " altas individualidades de Arganil ",a filarmónica local, legionários da Vila,crianças das escolas, representantes das juntas de freguesia, padre da paróquia,e funcionários publicos .
O povo primou pela ausência, e um dia destinado a ser festivo, passou a história triste, para esquecer.O cruzeiro retirado do poiso inicial está agora num canto da Vila, parece com razão ; é ruim lembrança.
Largo da feira e cruzeiro pouco depois da " inauguração".
A carta militar de Portugal escala 1/25000, é trabalho de grande mérito e honra quem mandou executar e quantos participaram na concretização do projecto.
No aspecto toponímico, as folhas que compõem o mapa apresentam muitas incorrecções, designadamente no concelho de Pampilhosa da Serra. A quadricula nº 253, apresenta relativamente a descrição da envolvente a vila:
Deparamos com nomes incorrectos, onde deveríamos ler: Boguela, aparece Boguelas, Modeiros em vez de Lodeiros. Estes são de somenos importância. Há um cuja nomenclatura, muda radicalmente significado do sitio.
Estou-me a reportar a Vale Solitário. Este topónimo não existe nem nunca existiu, o nome correcto é Vale do Salutário, como já algumas ocasiões escrevi, sempre deveria ter sido assim, pelo menos desde 1763.
O Vale do Salutário , é assim porque no local durante vários séculos, esteve instalada leprosaria e hospital de apoio a viajantes e também para servir de quarentena, a quem pretendia entrar na Vila nas ocasiões de fenómenos epidémicos, estava proibido pelas autoridades do burgo.
Salutário: significa, benéfico para a conservação ou recuperação da saúde, as casas ficavam numa barroca ou vale, daí o nome: Vale do Salutário
Este exemplo, chama atenção para o cuidado devemos ter sempre que consultamos as fontes documentais, mesmo de índole oficial e irrepreensível aspecto gráfico. O ditado popular está correcto "no melhor pano cai a nódoa".
Dos sítios cercanos a vila de Pampilhosa da Serra, um pela situação e visibilidade sempre me fascinou.
Recordo sendo miúdo passava tempo com meu pai , e nosso tio Zé Carloto, lagareiros no Lagar de Cima; quando assomava a porta da levada, deparava fronteira, caiada e vistosa a casa do pombal.
Lembro nessa altura, não seria habitada,depois foi comprada e ultimamente morava lá uma família. Isso é de somenos importância para dar a conhecer a história do sitio.
Até meados do século XIX, antes do telegrafo ter chegado a Pampilhosa; comunicações com o exterior além do serviço de correio, faziam-se utilizando, pombos , para cujo poiso e criação existia a cargo do Município, instalação denominada, " pombal ", em lugar adequado próximo da vila virado a sul ensolarado e abrigado , igualmente de fácil vigilância.
Na Pampilhosa da Serra, sitio escolhido, era onde encontramos actualmente a moradia.
Terminada a utilidade das aves mensageiras, venderam o terreno, novo proprietário, demoliu pombal, construindo casa, junto a caminho da vila seguia para Pescanseco, e Praçais, pela lomba, antes da construção em 1895 da ponte de entre as águas, sobre a Ribeira de Praçais.
A ponte de madeira , denominada da Covilhã, era percurso pedonal direcção aldeia de Sobral Valado e também ao alto Concelho.Isso é outra história.
Hoje quedo-me no antigo pombal, de onde podemos admirar belissimo panorama da Vila, apesar mesmo defronte,outro lado da ribeira, ficar cemitério de São Sebastião .